Esperando pelos Jetsons, vivendo como os Flintstones…
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por Redação JPF
Em 1962 era produzida uma série chamada os Jetsons, família simpática que vive suas aventuras no distante ano de 2062. Por mais que o desenho com cidades flutuantes e carros voadores não soe ainda tão familiar a nós, faltam cerca de 40 anos para vivermos no futuro imaginado pelos produtores do desenho. Entretanto, algumas realidades dessa animação não nos causam mais espanto.
Passam-se os anos e os “videofones”, como eram chamados no programa, estão cada vez mais desenvolvidos e as videoconferências já fazem parte da rotina de trabalho de muita gente atualmente, as aulas de ginástica e culinária a distância, que estão surgindo aos borbotões, o eletrofogão, onde a comida está ao alcance dos dedos, afinal, estamos assim tão distantes do futuro imaginado em Os Jetsons? Por que não? Substitutos da empregada-robô Rosie também já podem ser encontrados em lojas de varejo, desde robôs que limpam e lustram o chão até o Gidell, robô desenvolvido em 2019 que promete limpar e lavar banheiros.
Bob Hathcock, filho de Jerry Hathcock, criador do desenho e produtor de uma segunda fase do programa, desenvolvida em 1987, declarou em entrevista que os animadores não pretendiam fazer nenhum tipo de previsão do futuro, mas que o desenho se tratara de uma espécie de Flintstones às avessas.
Os Flinststones então, também criado nos anos 1960, retratava o cotidiano de uma família da classe média numa suposta Idade da Pedra. Os Flintstones representam bem como era as relações de trabalho de quando o desenho surgiu e foi criado. Em algum momento da pré-história, Fred Flintstone se apresenta na empresa do Sr. Pedregulho, carregando a marmita preparada pela esposa Wilma Flintstone e passa o dia todo lascando pedra…
Seu trabalho envolve força física, é repetitivo e supervisionado pelo seu chefe o tempo todo. Essa relação de trabalho representa o modo de produção Taylorista, dos primeiros métodos científico de gestão para as fábricas; antes disso, as fábricas eram desorganizadas, pouco eficientes e as relações de trabalho eram confusas e até violentas. Inspirados nas doutrinas militares, patrões aplicavam advertências e até castigos físicos enquanto obrigavam os empregados a se uniformizar, desde as roupas, aos comportamentos, Fred tinha que trabalhar duro e sem direitos…
Assim, o trabalhador, ao adentrar à fábrica, veste um uniforme, obedece a ordens, cumpre um rígido regulamento, é vigiado constantemente e punido quando quebra as regras. Ele abandona a sua individualidade e se despersonaliza, mesmo que tal sujeição tenha hora para começar e terminar, ela não é tão trivial como se supunha e pode vir a ser algo não mensurável nas ordinárias 40 horas semanais. Já no “Futuro”, George Jetson, é um trabalhador do “colarinho branco”, faz home office, seu trabalho é intelectualizado e normalmente consiste em apertar botões em um grande computador. Trabalha apenas duas horas por semana, também é constantemente vigiado por câmeras pelo Mr. Spacely, seu chefe, que o demite em quase todos os episódios, não obstante das condições e das tarefas desempenhadas, Geroge e Fred não estão assim tão distantes, apesar de que um lasca pedra e o outro aperta botões, mas será que no futuro os direitos trabalhistas ainda estarão assim, ou melhor, haverá direitos?
Ariano Suassuna (quem não o conhece, deveria!) descrevia o trabalhador brasileiro como um pobre-diabo, um eterno soturno, um ser infeliz, marcado pelo tédio e pela frustração. Claro que Suassuna ainda conseguia ser gracioso ao falar dessa realidade cotidiana, cruel e assoladora, outros autores brasileiros, nem tanto… Nelson Rodrigues, profeta do pessimismo, dizia que o dia em que a criatura humana perder a capacidade de admirar, cairá de quatro, para sempre. E o mal de todos nós, a nossa crise, a nossa doença é o admirar de menos, admirar pouco, é ter hora marcada pra admirar, ninguém admira mais nada, ninguém admira ninguém…
Essa impotência de sentimento, esse vazio de conteúdo, essa anestesia geral traduz um desinteresse vital e tremendo, expondo sintomas óbvios do contexto de nosso tempo, faz com que nos familiarizemos com uma realidade da “Idade da Pedra” mais que com a de um futuro que está a palpáveis 42 anos no horizonte. Hoje temos tudo, jornal, rádio, tv, tudo em nossos videophones, o que nos falta é exatamente a capacidade de cobrir os fatos com nosso espanto, o horror nos é banal e o futuro promete mais cidades boiando em esgotos do que flutuando no horizonte. Logo, enquanto sonhamos com os Jetons, vamos vivendo como os Flintstones.
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Redação JPF.
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